segunda-feira, 11 de julho de 2011

Crónica de Ventura Reis | Como os Gatunos se Tornam Ladrões



Capeia Arraiana é um new media on-line do Sabugal e do distrito da Guarda. Move-nos a paixão pela Raia, pelas terras do forcão, pelas serras da Estrela, da Malcata e das Mesas, pelo rio Côa e pelo povo valoroso que luta pelo futuro de uma região que alguns querem condenar ao fracasso. Defendemos as nossas tradições e trabalhamos para que a informação, a opinião e o debate de ideias estejam presentes no quotidiano dos que, como nós, amam as terras beirãs.



Esta crónica, tal como outras crónicas que já li do mesmo autor, está cheia de verdade e sabedoria!
É bom podermos aprender a sermos pessoas melhores e decentes, se já não o formos.
Há lições que a vida ensina e que devemos aprender até morrer.
Eu subscrevo tudo o que o autor escreve.
JOÃO

Como os gatunos se tornam ladrões


Ventura Reis - TornadoiroO furto é a subtracção de coisa que é de propriedade alheia. Já o roubo é a subtracção dessa mesma coisa de propriedade alheia por meio de ameaça ou de violência. Claro que o conceito de violência não se resume ao uso da força contra alguém, sendo alargado a actos como o arrombamento, o escalamento e até o uso de chave falsa.
Exemplificando: um indivíduo que faz uma espera a um outro e se apossa da sua carteira por meio de intimação física, apontando-lhe uma pistola, comete o crime de roubo e não de furto, visto que fez uso da ameaça.
Havendo esta destrinça, há que considerar também que furto e roubo são praticados por agentes diferentes. O agente do furto limita-se a subtrair o que não é seu, enquanto que o agente do roubo subtrai o que não lhe pertence ameaçando e violentando para o conseguir. Assim, devemos chamar gatuno ao agente do furto e ladrão ao agente do roubo.
Não estaria o mundo tão mal se só houvesse gatunos, ou melhor, se todo o gatuno sempre o fosse e nunca passasse a ladrão. E digo isto porque de forma geral todo o ladrão começa por ser gatuno, mas permanece nessa categoria por pouco tempo pois, ambicionando fazer carreira, tudo faz para mudar de posto.
Os gatunos frequentam a escola do furto, tendo por mestres outros gatunos mais velhos que lhes ensinaram as manhas, pelo que depressa se aventuram em acções mais ousadas, indo facilmente cair no roubo. E quando caem no roubo atingem o apogeu das suas carreiras, tornando-se violentos, o que os leva facilmente ao cometimento de crimes graves mediante o uso dessa violência.
Na actualidade, a melhor escola do crime é a prisão, pois é lá que os mais experientes dão lições aos aprendizes que ali vão parar, preparando-os para se dedicarem ao roubo com bom desempenho e com requintes de malvadez. Noutro tempo, a prisão não cumpria esse nefasto papel de ser a escola do crime, pela simples razão de que o sistema prisional antigo era rígido e o condenado que a habitava recebia vivo e merecido castigo pelos males que cometera. Como o ladrão que fosse apanhado sabia que ia parar à cadeia e que aí penaria pelo crime, mais eram os que se contentavam com a gatunice do que aqueles que davam o salto para a ladroagem.


«Tornadoiro», crónica de Ventura Reis

Sem comentários:

Enviar um comentário