sexta-feira, 15 de abril de 2011

Daniel Oliveira: Antes Pelo Contrário | «Fernando Nobre: Quanto Custa Um Vaidoso?»

Na rubrica de Daniel Oliveira, Antes pelo Contrário, do Expresso, o primeiro artigo desta semana, segunda, dia 11, foi sobre a "bomba" lançada por Passos Coelho: Fernando Nobre como cabeça-de-lista por Lisboa e canditado a Presidente da Assembleia da República.
Todos os dias vou tentar lembrar, aqui, esta decisão de Passos Coelho e a intenção de Fernando Nobre continuar a querer preencher um cargo político, nem que para isso tenha que correr os partidos todos que existem legalizados em Portugal.
Como gostei muito deste artigo, fica aqui para aqueles que não o leram.
JOÃO


Fernando Nobre: quanto custa um vaidoso?
Daniel Oliveira (www.expresso.pt)
8:00 Segunda feira, 11 de abril de 2011
Fernando Nobre vai ser cabeça de lista do PSD no circulo de Lisboa. Contra um homem de convicções - mesmo que não sejam as minhas - como Ferro Rodrigues, o PSD aposta num ziguezagueante populista. O ex-candidato estava no mercado e Passos Coelho pagou o preço que lhe foi pedido: dar-lhe a presidência da Assembleia da República. As contas foram de merceeiro: Nobre vale 600 mil votos. Errado. Se os votos presidenciais nunca são transferíveis para legislativas, isso é ainda mais evidente neste caso. Todas as vantagens competitivas de Nobre desapareceram quando ele aceitou este lugar.

O PSD vai perder mais do que ganha. Porque este convite soa a puro oportunismo. Porque quando Fernando Nobre começar a falar o PSD vai ter de se virar do avesso para limitar os danos. Porque a esmagadora maioria dos eleitores de Nobre nem com um revólver apontado à cabeça votará em Passos Coelho. Porque ele afastará eleitorado que desconfia de gente com tanta ginástica política.

Quem também não fica bem na fotografia é Mário Soares, que, na última campanha, por ressentimento pessoal, alimentou esta candidatura. Fica claro a quem ela serviu. Agora veio o agradecimento. 

Quanto a Fernando Nobre, é tudo muito banal e triste. Depois da campanha que fez, este é o desfecho lógico. Candidatos antipartidos, que tratam todos os eleitos como suspeitos de crimes contra a Pátria - ainda não me esqueci quando responsabilizou Francisco Lopes pelo atual estado de coisas, apenas porque é deputado - e que julgam que, por não terem nunca assumido responsabilidades políticas, têm uma qualquer superioridade moral sobre os restantes acabam sempre nisto. A chave que usam para abrir a porta da sala de estar do sistema é o discurso contra o sistema. Não querem "tachos", dizem eles, certos de que todos os eleitos apenas procuram proveitos próprios. Eles são diferentes. Depois entram no sistema para mudar o sistema, explicam. E depois ficam lá, até vir o próximo com o mesmo discurso apontar-lhes o dedo. É tudo tão antigo que só espanta como tanta gente vai caindo na mesma esparrela.

Quem tem um discurso sem programa, sem ideologia, sem posicionamento político claro e resume a sua intervenção ao elogio da sua inexperiência política tem sempre um problema: só é diferente até perder a virgindade. E quando a perde fica um enorme vazio. Porque não havia lá mais nada. Porque a política não se faz de bons sentimentos, faz-se de ideias, projetos e programas políticos. Ideias, projetos e programas que resultam do pensamento acumulado pela experiência de gerações, que se vai apurando no confronto e na tentativa e erro. A tudo isto chamamos ideologias. Quem despreza a ideologia despreza o pensamento. Quem despreza o pensamento despreza a política. Quem despreza a política dificilmente pode agir nela com coerência e dignidade.

Para além do discurso contra os políticos, este político teve outra bandeira: as suas preocupações sociais. Nada com conteúdo. Para ele bastava mostrar o seu currículo de ativista humanitário. E a quem aceita ele entregar a sua virginal e bondosa alma? Ao candidato a primeiro-ministro mais selvaticamente liberal que este País já conheceu. Não sou dos que acham que toda a gente tem um preço. Mas ficámos a saber qual é o de Fernando Nobre: um lugar com a dimensão da sua própria vaidade.

Tudo isto tem uma vantagem: é uma excelente lição de política para muita gente. Quem diz que não é de esquerda nem de direita, quem tem apenas a sua suposta superioridade moral como programa e quem entra no combate político desprezando quem há muito o faz nunca é de confiança. Um dia terão que se decidir. E Nobre decidiu-se: escolheu a direita ultraliberal em troca das honras de um lugar no Estado. Na hora da compra, os vaidosos têm uma vantagem: saem mais baratos. Não precisam de bons salários ou de negócios. Basta dar-lhes um trono e a sensação de que são importantes. Vendem a alma por isso.

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